O amor acaba.
Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois do teatro e do silêncio.
Acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar.
De repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel, ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinza o escarlate das unhas.
E acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados; e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado.
Na insônia dos braços luminososos do relógio. Mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia.
No sábado depois de três goles mornos de gim à beira da piscina.
Em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadeza, onde há mais encantos que desejo.
Em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero.
Nos roteiros de tédio para o tédio, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada.
Em cavernas de sala e quartos conjugados, o amor se eriça e acaba.
No inferno o amor não começa.
Na usura o amor se dissolve.
Uma carta que chegou depois, o amor acaba.
Uma carta que chegou antes, o amor acaba.
O amor acaba na descontrolada fantasia da libido.
Às vezes acaba na mesma música que começou, no mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes.
No coração que se dilata e quebra e o médico sentencia imprestável para o amor.
Às vezes o amor acaba como se fosse melhor nunca ter existido, mas pode acabar com doçura e esperança.
Uma palavra muda e articulada e acaba o amor: na verdade, no álcool, de manhã, de noite, na floração excessiva da primavera, no abuso do verão e na dissonância do outono.
Em todos os lugares, a qualquer hora e por qualquer motivo o amor acaba.
Acaba para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto.
-Paulo Mendes Campos
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